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A professora Debora Garofalo atua há 14 anos na rede pública de São Paulo e foi considerada uma das dez melhores professoras do mundo pelo Global Teacher Prize 2019. Em sua apresentação no Seminário Tecnologia e Currículo: uma proposta a ser desenvolvida por todos, durante o 2º Sesi com@Ciência, que termina nesta terça-feira (1º), na FIERGS, Debora deu mais do que uma aula de tecnologia para os educadores presentes. Em uma palestra recheada de histórias de vida e muita emoção, ela ressaltou a importância da atenção, do carinho e de ter uma escuta atenta com os alunos.

Formada em Letras e Pedagogia, há quatro anos Debora resolveu abraçar um desafio. Dar aula de tecnologias na Comunidade Alba, na periferia de São Paulo, que apresenta um dos maiores índices de violência urbana e tráfico de drogas na cidade. O local, que fica na Zona Sul da capital paulista, próximo a bairros nobres como Jabaquara e do Parque Ibirapuera, sequer tem saneamento básico. E as crianças vivem uma realidade ainda mais dura. “70% dos pais ou mães estão presos”, alerta a professora.

Debora ainda se deparou com uma dificuldade a mais. A escola estava rodeada de lixo, o que provocava mau cheiro, doenças e alagamentos em dias de chuva. “Tive a ideia de transformar esse lixo em robótica”, conta. A princípio, os alunos não gostaram da proposta de ir recolher lixo nas ruas. Ela sugeriu, então, que eles levassem os celulares e fotografassem a missão. O resultado é que não só registraram o lixo e a sucata, como também passaram a refletir sobre a situação em que viviam.

Na primeira aula já com a sucata, os alunos criaram um carrinho movido a balão e isso aguçou a curiosidade deles. “Outras turmas também quiseram fazer parte e foi nesse momento que virei a professora de robótica”, recorda. Depois, vieram robôs, outros carrinhos e vários protótipos confeccionados a partir do desejo dos próprios alunos. Os resultados foram exibidos em feiras para a comunidade e o excedente de sucata era vendido para comprar placas e outros componentes necessários para a produção de robôs. “Os alunos chegaram a expor seus trabalhos na Bienal do Ibirapuera e perceberam que eram capazes de mudar sua própria realidade”, observa Debora.

Sesi com@Ciência - Debora Garofalo

Crédito foto: Dudu Leal

Ela relatou a história de um menino que construiu uma réplica de sua casa, com um temporizador para que as luzes fossem apagadas, quando não houvesse ninguém no ambiente. Quando justificou o projeto, ele contou que havia perdido a irmã em um incêndio em casa e não queria que outras crianças passassem pelo que ele passou.

Outro menino, o Willian, tinha 13 anos e sonhava em ser piloto de avião, mas não era alfabetizado, mesmo estando na escola desde pequeno. Com as aulas, ele construiu um helicóptero e disse: “Meu sonho é ser aviador, mas eu quero que antes você me ensine a ler e escrever”. Debora ficou triste em saber que o menino havia passado pela escola sem aprender. Com aulas depois do horário, ele foi alfabetizado e também realizou o sonho de voar de helicóptero, graças a um empresário que assistiu a uma palestra de Debora e ofereceu o presente ao estudante. Mais que isso. Willian venceu. “Ele passou no vestibular para Física na USP”, comemora a professora.

Debora também ganhou reconhecimento, ao ser escolhida como uma das dez melhores professoras do mundo pelo Global Teacher Prize 2019, o Nobel da Educação.  Mais do que o prêmio, a professora comemora o resultado das aulas de robótica com sucata, que levaram a uma redução de 93% de evasão escolar e de 95% do trabalho infantil. Também contribuiu com a retirada de uma tonelada de lixo das ruas de São Paulo e com o aumento de coletores e parcerias.

A iniciativa que beneficiou 2 mil alunos também vai crescer. O projeto virou política pública no Estado de São Paulo e deve chegar a 2,5 milhões de estudantes. Também está sendo replicada na Argentina, nos Estados Unidos e na Inglaterra. “É possível fazer muito com muito pouco”, resume Debora.

A INSERÇÃO DA TECNOLOGIA NA CAMINHADA DOCENTE
Debora Conforto é daquelas professoras que serão estudantes para sempre. Doutora em Educação na linha de pesquisa de informática na educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), ela ministrou uma das palestras mais lotadas da tarde desta terça-feira (1º) no Sesi com@Ciência. Não foi por acaso. O tema tecnologia instiga e desafia educadores porque, justamente, não é algo que se possa ignorar, e muda cada vez mais a uma velocidade alta. “Os alunos são digitais. Os professores, nem todos. Mas depois que aprendemos a usar a tecnologia a nosso favor, é tudo de bom”, disse ela.

Sesi com@Ciência - Debora Conforto

Crédito foto: Dudu Leal

De acordo com Debora, as escolas até já possuem conexão e equipamentos, mas são subaproveitados. “Trabalhei em uma instituição onde usávamos o famoso Skype para reuniões entre professores, mas não passava de uma ferramenta de comunicação prática. Um dia, usei em sala de aula para conectar turmas em apresentações de trabalhos”, contou. O resultado foi que esse tipo de uso motivou os alunos a quererem participar mais.

O desenvolvimento de softwares, jogos online, ferramentas de pesquisa e toda a diversidade de aplicações computacionais não tem mais volta no mundo da educação. “Professores de novas gerações poderão lidar melhor com isso, é verdade. Mas não podemos deixar de incentivar todos. A era da conectividade ainda vai nos surpreender”, encerrou.

O Sesi com@Ciência é um encontro com foco em educação que reúne, na segunda e terça-feira, das 9h às 21h, no Centro de Eventos FIERGS, estudantes, docentes e pesquisadores debatendo junto com a sociedade, analisando e projetando o desenvolvimento do Brasil nesse tema. A expectativa é pela participação de mais de 10 mil pessoas em todas as atividades nos dois dias do evento.

Confira a programação aqui.

Publicado Terça-feira, 1 de Outubro de 2019 - 17h17