Lançado pela Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (FIERGS) em 1989, o Relatório Sayad, elaborado pela consultoria do economista João Sayad, ex-ministro do Planejamento no governo José Sarney, serviu à época como um estudo valioso aos gestores públicos, defendendo iniciativas para a modernização do Estado. Construído sobre dois eixos, o da eficácia da administração e o da avaliação do setor público, o documento faz diagnósticos dos gargalos da administração e sugere ações para o crescimento da economia e o melhor atendimento das necessidades da população. “Há 30 anos, a FIERGS já alertava que a situação do Rio Grande do Sul poderia se tornar insustentável como está hoje, e o relatório apontava caminhos para o equilíbrio das contas públicas”, salienta o presidente da entidade, Gilberto Porcello Petry.
Segundo a Unidade de Estudos Econômicos (UEE) da FIERGS, há diferenças importantes a se considerar da época para o ano de 2019. Uma delas é que os dados do relatório abrangem até o ano de 1987 – antes da Constituição de 1988, que instituiu o ICMS e concedeu mais recursos e obrigações aos municípios –, período de inflação elevada que distorcia completamente as informações de receitas e despesas públicas, mascarando o problema fiscal. Mas a economia gaúcha já crescia menos que a brasileira há três décadas, situação que permanece até hoje. Outro aspecto da situação econômico-financeira do RS ao final da década de 1980 é de que já havia grande endividamento, com o déficit financiado pelo sistema financeiro do Estado. A dívida pública representava 113,9% sobre a receita corrente, e hoje só piorou, alcança 223%. Mais de 53% do déficit da administração direta era financiado por instituições como a Caixa Estadual e o Banrisul, gerando dívida dentro do próprio Estado.
Além disso, a despesa com pessoal igualmente ocupava grande espaço no orçamento. A título de comparação, em 1986, os gastos com a folha dos funcionários representavam 114% do Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICM). Em 2017, foram cerca de 113% do ICMS, essa proporção ficou relativamente estável porque tanto a receita quando o gasto com pessoal cresceram muito no período. O aumento acelerado dos inativos impactava nas contas públicas, consumindo 1/3 da arrecadação à época. Já em 2017, o gasto com aposentados foi de 46% da Receita Corrente Líquida (RCL) do RS. “É de se destacar como o Relatório Sayad conseguiu antecipar toda a melhora institucional que o Brasil teve nos anos 90 e no início dos anos 2000. Na última década dos anos 90 o Brasil começou a ter uma taxa de inflação controlada e uma organização institucional, mas o Rio Grande do Sul segue com seus mesmos problemas desde lá”, observa o economista-chefe da FIERGS, André Nunes de Nunes.
INICIATIVAS
Nesse período de 30 anos, algumas recomendações do Relatório Sayad foram implementadas, por inciativas do governo estadual ou avanços na legislação federal. Entre elas estão a implantação do Sistema de Caixa Único, em 1991; e a limitação das despesas de pessoal a uma fração da receita líquida. Em 2000, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) definiu os limites para despesa com pessoal nos estados em 60% da RCL, embora atualmente mais da metade das unidades da Federação já tenham estourado esse limite. Outra das sugestões do relatório da FIERGS, como a fusão de fundações, foi concretizada em 1991, com a criação da Fundação Gaúcha do Trabalho e Ação Social (FGTAS) em substituição à Fundação Sul-riograndense de Assistência (Fundasul) e à Fundação Gaúcha do Trabalho (FGT).
Propostas da FIERGS relativas ao saneamento, fusão ou fechamento de empresas estatais, porém, demoraram a serem executadas ou sequer foram concretizadas. É o caso da CEEE, cuja privatização, juntamente com a CRM e a Sulgás, foi aprovada pela Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul apenas no início deste mês, 30 anos depois. Para a Corsan e o Daer, a recomendação do relatório é de que algumas funções fossem transferidas para os municípios, e o Sistema Financeiro Estadual integrado sob o comando do Banrisul, transformando-o em Banco Múltiplo. “O Brasil evoluiu institucionalmente na gestão, mas o Rio Grande do Sul não apresentou uma solução estrutural em três décadas. O que o Estado mais fez ao longo desse tempo foi buscar fontes alternativas de financiamento, ao invés de procurar sanar seus graves problemas, algo que já poderia ter acontecido”, conclui o presidente da FIERGS.